Lomadee, uma nova espécie na web. A maior plataforma de afiliados da América Latina.

domingo, 27 de outubro de 2013

terça-feira, 22 de outubro de 2013

Artigo científico: A EDUCAÇÃO E A RESSOCIALIZAÇÃO DO HOMEM COMO PRESO: A MURALHA DE FERRO QUE ANULA A CIDADANIA


A muralha de ferro que anula a cidadania (foto: Mídia News)
                                                                             Ivana Silva de Santana1
                                       Jose Alexandre de Souza Menezes2.

           Lembrem-se dos presos como se vocês estivessem na prisão com eles. Lembrem-se dos que são torturados, pois vocês também têm um corpo.

Paulo de Tarso
Carta aos Hebreus 13,3

INTRODUÇÃO
     
      O tema deste artigo é baseado em minha tese de doutorado, explicitado no título em metáfora, trata da muralha de ferro que anula a cidadania do homem como preso através de processos sócio educativos enquadra-se no âmbito do direito penal, na execução da pena de prisão, numa visão específica de privação de cidadania como forma de ressocialização do encarcerado. De acordo com o Relatório Global 2002 do Human Rights, as execuções, maus tratos e tortura continuaram sendo os mais graves problemas relacionados às questões de direitos humanos no Brasil, sendo a própria força policial e os oficiais de carceragem os principais agentes perpetuadores dos abusos cometidos.
Vem sendo denunciado que o  Sistema Prisional Brasileiro é mais criminoso que o crime cometido pelo preso, em uma sociedade onde as pessoas querem que alguns sejam excluídos por violarem os mecanismos pré-estabelecidos.As prisões, em geral, são incapazes de ressocializar o apenado por processos sócio educativos .
A Justiça Penal no Brasil, de acordo com Edmundo Oliveira (2007) tem o retrato peculiar de anulação da cidadania do preso.  Em primeiro lugar, acostumou-se a mandar para trás das grades os miseráveis que formam a maioria absoluta nas prisões.  “É a força secular da alternativa de exclusão, sempre galgada no argumento da neutralização, amontoando pessoas em números superiores aos padrões recomendados pela Organização das Nações Unidas”.
Na desordem penitenciária, em termos de proteção aos direitos humanos, o Brasil não atende ao pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, ditado pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 1966, nem à Convenção Americana. sobre Direitos Humanos, conhecida com Pacto de San José da Costa Rica, aprovada pela Organização dos Estados Americanos (OEA), em 1969.
De acordo com o Relatório da II Caravana Nacional que analisou o Sistema Prisional Brasileiro, da Comissão de Direitos Humanos da Câmara de Deputados Federal, em setembro de 2000, foram relatados fatos  sobre a violência do sistema penitenciário, quanto aos direitos humanos , desrespeitos à condição humana nas prisões brasileiras.
A questão básica que se tornou o  fio-condutor ou leitmotiv deste estudo é: Quais são as significações construídas pelos presidiários em suas experiências de direitos humanos expressas nas vivências dos lugares, tempos e cenas dos Institutos Penais?
Como objetivo geral buscou-se evidenciar as significações construídas pelos presidiários em suas experiências de direitos humanos, expressas nas vivências dos lugares, tempos e cenas da Instituição Penal.
      FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Löic Wacquant (2007), em seu livro “Punir os Pobres[1], argumenta que a prisão, de um modo geral, funciona como um aspirador social para limpar as escoridetritos produzidos pelas transformações econômicas em curso e remover os rejeitos da sociedade de mercado do espaço público.Wacquant (2007, p.455) argumenta que a prisão tem servido como “aspirador da escoria social”, baseando-se no seu artigo “A Aberração Carcerária à Moda
a)      A criminologia comparada estabelece, de forma incontestável, que não existe nenhuma correlação – em nenhum país e em nenhuma época – entre a taxa de aprisionamento e o nível de criminalidade;( CHRISTIE,2001).
b)     Todos os estudos mais rigorosos concluem o oposto, ou seja, a estratégia de policiamento da “Tolerância zero”, levada a efeito em Nova Iorque e a quadruplicação em 25 anos, do número de presos nos Estados Unidos da América desempenharam um papel não importante na queda vertical da criminalidade que resultou de uma incomum conjunção de fatores econômicos, demográficos e culturais; ( CHRISTIE,2001).
c)      A história penal mostra que, em nenhum momento e em nenhuma sociedade, a prisão soube cumprir a sua suposta missão de recuperação e de reintegração social, na perspectiva da redução da reincidência.
d)     Não é prisão que promove a reinserção. Ai já é tarde demais. Para integrar as pessoas é preciso dar trabalho, igualdade de oportunidade no começo, na escola. Medidas de cunho social podem ser integradas, mas ai já é tarde demais (CHAUVENET, ORTIC E BENGUIGUI, 1994, p.38)
e)      Contrário as supostas “virtudes pedagógicas” das sanções penais e mesmo do encarceramento, daqueles que invocam o ideal da justiça social para justificar a intensificação da repressão penal.
f)      Dentro das prisões, as trajetórias e as condições de vida dos presidiários são marcadas por desigualdades de classe muito profundas. Do registro de entrada e da destinação, passando pelas transferências, pelo acesso aos recursos internos e ao direito de progressão, no cumprimento da pena, cada etapa do percurso carcerário contribui para o empobrecimento cumulativo dos presos mais carentes em virtude da absoluta prioridade concedida, na gestão quotidiana, ao imperativo da segurança (WACQUANT, 2007, p.461).
g)     Os danos e perdas em razão do encarceramento se projetam não somente nos presos, mas também de forma injusta e inaceitável sobre seus familiares, especificamente sobre suas esposas. Desconstrói suas relações de amizade, de vizinhança, suas relações financeiras, projeta problemas de escolaridade nos filhos (“filhos de pai preso”); exclusões; enfim, pesado ônus e fardo.
h)     A prisão apresenta-se como uma “bomba social” que regurgita quase todos aqueles que são “engolidos” por ela; eventualmente “expelidos” de volta à sociedade. Devolve à sociedade um cidadão “piorado”, mais propenso a cometer delitos e crimes. Ele está interditado, incapacitado e portando outras desvantagens derivadas do fato de ter sido fichado e estado na penitenciária.
João Faria Junior (1996) sugere que os principais fatores que indicam a crise no sistema penitenciário brasileiro são: a ociosidade dos presos do Brasil: apenas 5% trabalha; irrisória remuneração, não obstante o mínimo de ¾ determinada pela Lei de Execuções Penais;a superlotação, a falta de vagas, ultrapassa a marca dos 50 mil, sem contar os mais de 300 mil mandados de prisão não cumpridos. A superlotação é a principal causa das rebeliões nas prisões; a promiscuidade é a conseqüência da superlotação, por se reunirem numa mesma cela um amontoado de pessoas das mais variadas espécies; a formação de grupos mafiosos que são comandados por lideres que exercem poder de dominação sobre, os demais presos, com o objetivo de adquirir armas; bancar o jogo de azar; tráfico de drogas, tabaco e álcool; cobrar por proteção e violentar sexualmente outros presos; fugas, motins, greves, violência, privilégios de certos presos e discriminação de outros, corrupção dos funcionários, falta de capacidade administrativa para gerenciar o estabelecimento prisional, falta de verbas, etc..

O sistema de Justiça no Brasil contemporâneo vem se qualificando como ineficiente, em termos de desempenho de suas três funções básicas: a instrumental, a política e a simbólica, conforme Boaventura Santos et al. (1996):
a)      instrumental – o judiciário e o Ministério Público são o principal loci de resolução de conflitos;
b)      política – eles exercem um papel decisivo como mecanismo de controle social, fazendo cumprir direitos e obrigações contratuais, reforçando as estruturas vigentes de poder e assegurando a integração da sociedade;
c)      simbólica – eles disseminam um sentido de equidade e justiça na vida social, socializam as expectativas dos atores na interpretação da ordem jurídica e calibram os padrões vigentes de legitimidade na vida política.

Assim, o sistema de Justiça no Brasil contemporâneo vem se qualificando como ineficiente, em termos de desempenho de suas três funções básicas: a instrumental, a política e a simbólica, conforme Boaventura Santos et al. (1996).

A Figura 1 apresenta a sinopse do Consensualismo Penitenciário, conforme Edmundo Oliveira (2005). Trata-se de um tratamento consensual necessário a um processo sócio educativo de ressocialização..

Figura 1 - Consensualismo Penitenciário. 
Fonte: Oliveira (2005).


De acordo com Edmundo Oliveira (1995), a Justiça Penal no Brasil tem o retrato peculiar da seletividade na punição. Acostumou-se a mandar para trás das grades os miseráveis que formam maioria absoluta nas prisões. É a força secular das “alternativas de exclusão”, sempre galgada no “argumento da neutralização”, amontoando pessoas em números superiores aos padrões recomendados pela Organização das Nações Unidas.
        Conclusivamente, segundo Wacquant, o estado Brasileiro é o incubador e reprodutor do movimento globalizante e seus resultados nefastos com repúdio, melhor dizendo da classe dominante, pelos miseráveis, o que ocasiona uma política de isolamento e repressão destes indesejados. Ainda, contextualizando para a atual sociedade da estética, que tem no narcisismo sua característica mais forte, o individualismo surge próspero neste meio, atitude que promove o distanciamento entre os indivíduos. O eu ocupa o lugar do nós – peculiaridade de grupos sociais arcaicos – conduta responsável por causar, também, uma competição ferrenha pelo “sucesso”, afinal de contas, o relevante na contemporaneidade é a aparência "limpa" e o espetáculo.

O PERCURSO METODOLÓGICO

Dada a questão básica e tendo como objeto desvelar as significações construídas pelos presidiários sobre suas experiências, na situação de cárcere, no relato de suas experiências em termos de direitos humanos, utilizou-se da Teoria da  Representação Social  método que ajudou  a perceber, buscar, apreender e refletir sobre o sujeito, objeto da investigação como representação social do apenado;  dando-se especial atenção às suas narrativas,e história de vida; experiências e vivências, Segundo Laville e Dionne, (1999) a historia de vida, as experiências e vivências, podem ser configuradas como uma narração autobiográfica “uma vez que é a própria personagem que a constrói e a produz, estimulada, influenciada ou orientada pelo pesquisador, que deve se mostrar discreto” (Laville & Dione, 1999, p.158).
Optou-se pelo método das representações sociais, e a utilização da técnica de entrevista semiestruturada (além das histórias de vida, que já se mencionou), como sugerido por Chizzoti (1998) e Laville e Dionne (1999).  Essa técnica de entrevista é um meio de colher informações baseado no discurso livre.  Dessa forma, presume-se que quanto mais livre se sentir o investigado, quanto mais confiar no pesquisador, mais irá emergir o conteúdo e o discurso, com bastante riqueza.
Compreender e desvelar as representações sociais (mediante falas) e identificar as condições em que se situam os sujeitos ao emitirem-nas seria partir do dito e desvelar o não dito. Na análise, a escolha de categorias é fundamental, pois elas dão forma concreta às escolhas teóricas e metodológicas do processo de investigação. Como diz Moscovici, as Representações Sociais são uma maneira particular de conhecimento presente no senso comum, tendo como função à orientação para a ação, no cotidiano, ao mesmo tempo em que é diretriz na interação entre os indivíduos (1978).
Entre as técnicas de pesquisa qualitativa utilizadas, optou-se pelas entrevistas semi-estruturadas, com os indivíduos; por considerar mais livremente o relato das histórias de vida dos presidiários, e narrativas de suas vivencias e experiências. Com esses procedimentos de investigação passou-se a desvelar o contexto do cárcere, na perspectiva dos detentos.
A pesquisa tem como cenários diversos presídios no Brasil, em Estados da Bahia, do Rio de Janeiro, da Paraíba, de São Paulo, do Pará e de Minas Gerais.A população eleita para a presente pesquisa qualitativa é composta por presos, por escolha intencional, capazes de permitir adentrar, sob mútua confiança, na pesquisa das representações sociais, sobre as experiências que estavam vivenciando no cárcere.  Buscou-se detentos dos quais se conhecia a gravidade das delações, das problemáticas de violências e coações a que estavam envolvidos; bem como de possíveis redes dentro e fora dos presídios.

RESULTADOS
                                         ...preso bom é preso morto”,

A analise de discurso dos entrevistados, apenados e agentes presidiários, através das falas nas entrevistas, dos ditos e não ditos  desvelou as condições  em que se encontram os detentos, jogados e esquecidos “nas masmorras” do desrespeito, esquecendo-se eles próprios de que são seres humanos. Ao invés de se reabilitar, o detido passa a nutrir um ódio cada vez maior pela sociedade que o colocou ali. Em sua mente, movido pela força natural de seu raciocínio, a sociedade não lhe deu emprego, educação ou qualquer condição que lhe garantisse a subsistência.
Observa-se que dentro das instituições pesquisadas em vários estados do Brasil,inclusive em Serrinha-Bahia; tomado como amostra , o ser humano sofre um processo de deformação e desconstrução pessoal, é “desprogramado” por um processo desumano, que começa com sua acolhida ou recepção, por meios de rituais, conhecidos como “boas vindas”, onde a equipe de supervisão, o grupo de internados, ou ambos, procuram deixar de forma bem clara a sua situação inferior no grupo em que estão adentrando. Ao ser “admitido” no presídio, após passar pelo seletivo processo de recrutamento do sistema penal,  o indivíduo é despido de sua aparência usual, ele é identificado, “recebe um número”, é tirada a sua fotografia, impressões digitais, distribuídas roupas da instituição, resumindo, um verdadeiro processo de “despersonalização”. Um indivíduo não é mais um indivíduo, ele passa a ser uma engrenagem no sistema da instituição, devendo obedecer a todas as regras da mesma, e, caso não o faça, será “reeducado” pelos próprios companheiros ou pela equipe de supervisão. A máquina da instituição total não pode nunca é parar...
Além da deformação e desconstrução pessoal que decorre do fato de a pessoa perder seu conjunto de identidade, existe a desfiguração pessoal que decorre de mutilações diretas e permanentes do corpo – por exemplo, marcas ou perda de membros. O importante é deixar claro, ao indivíduo, que o mesmo está num ambiente que não garante sua própria integridade física. Entretanto, seguindo o sistema, poderá não lhe ocorrer nada.( CALHAU ,1999).
Às falas dos apenados, a seguir transcritas, foram adicionadas observações da pesquisadora, nos contextos onde se deram o aprofundamento da questão: Quais são as significações construídas pelos presidiários em suas experiências de Direitos Humanos expressas nas vivências dos lugares, tempos e cenas da Instituição Penal? Entre os vários depoimentos tomados em varias instituições brasileira  escolhemos o Presídio Estadual de Segurança Máxima de Serrinha (BA).
Os seguintes depoimentos  foram  prestados à pesquisadora em Serrinha,por apenados e agentes de segurança ,sob garantia de privacidade dos informantes:
[...]A visita ao preso começa com a esposa que ao chegar ao presídio vai ser revistada. Agachamento: as mulheres têm que ficar nua, e geralmente é introduzido um objeto na vagina e no anu para verificação.
...Sob suspeita, 400 homens tiveram que ficar nus simultaneamente para revista, situação que humilhava não só os internos, mas também os próprios agentes. A revista individual implicava em posicionamento, disposição de partes intima. A ida diária à escola, em condições de trabalho ou ao banheiro implica em revista íntima o que é constrangedor.
...Os católicos transgridem as normas internas do presídio, dando acesso a noticia aos parentes, denunciado nos meios de telecomunicações as irregularidades internas.
...Os bens de consumo que são fabricados internamente, se consumidos antes do prazo de 30 dias, o interno vai ficar sem fazer a higiene completa.
...Para o ex - agente, o ambiente o piorava, porque ele convivia com muitas barbaridades, então ele se tornava também perverso. O ex- agente achava uma diversão, um passa tempo, bater no preso, colocava em posições não corretas as algemas de forma desconfortável, tratava os internos de viado, bicha, descarado.
...O preso, ao fazer qualquer reivindicação era torturado: espancamento com artefatos que não deixavam sequelas, porque estas eram internas, entre estes artefatos estavam cassetes fabricados de fibra especial; amedrontava com Pitbul próximo ao rosto do interno, fazia tortura mental dizendo que ele ia ser estuprado na cela.
...O interno, ao chegar ao presídio, sofre a pratica de ato libidinoso; todos os internos novatos servem de mulherzinha para os outros internos. O interno pede para morrer, e praticam suicídio.
...Caso do negão que estuprou os avôs e matou, foi condenado a 40 anos de reclusão. Um cara desses que está acostumado à pratica de estupro, dentro do presídio vai persistir na prática de estupro com os outros internos.
...O interno, quando não obedece às ordens da frente da cadeia, é espancado por vários outros internos, e o agente faz de conta que não vê.
...Após os espancamentos, os internos jogam o interno espancado no saguão, e somente ali é que os agentes percebem e conduz o preso à enfermaria. Caso o interno fique em estado grave, e se não tiver viatura, ele terá que ficar aguardando até a disponibilidade da viatura.
...Os espancamentos não são registrados. ...Os professores, o diretor, a assistente social, o psicólogo, médico, enfermeira, psiquiatra, cozinheiros, etc., tomam conhecimento dos espancamentos e outras violações sofridas pelo interno, e tudo que acontece “morre ali”. O próprio diretor do presídio orienta os profissionais que ali trabalham para não divulgar.
...O professor que ministra aulas no presídio não pode conversar com o interno. O contato entre o preso e o professor é proibido.
...O interno que comete alguma irregularidade é enviado para o castigo – o interno não é liberado para nada.Exemplo: o interno comete um ato irregular, reúnem todos os internos daquele pavilhão e os agentes pressionam aqueles internos a denunciar quem praticou o ato irregular, sendo que enquanto os internos não caguetar quem praticou a irregularidade, ficam os internos presos numa cela, sem direito a nada, não tomam banho, não tomam banho de sol, não se alimentam, não tem liberdade para ir ao sanitário, ficam todos juntos em isolamento num solarium.
...Os agentes sabem que ao se reunir os internos para um deles fazer a delação, os internos geralmente vão delatar o interno mais fraco, ou então, ao não aguentar mais o sofrimento, o tratamento desumano, a fome, a implicação de não direito à visita, um interno assume o erro, e vai ser levado para a triagem e ser espancado pelos agentes por ter assumido o ato considerado irregular.
...Um interno chegou por prática de estupro numa menor, e ao chegar ao presídio o diretor deu a ordem para conduzir o interno estuprador para uma cela individual, mas o agente fez de conta que não entendeu a ordem e conduziu o interno estuprador para uma cela com 16 homens e deu a alerta de que o interno era estuprador, menina, e o interno foi violentado pelos 16 que ali se encontravam.
....A senha indicando que o interno é estuprador ou pedófilo é o agente desmunhecar...O agente se delicia com todas as torturas e humilhações praticadas contra os internos.
..Num dia de domingo, sem a presença do diretor, o agente não tinha o que fazer, resolveu se divertir com um interno retirou: o interno da cela, e ao entrevistar o interno mandou ele dizer por que se encontrava preso, qual o seu crime, sendo que este procedimento é contrario à determinação do presídio.
...Este procedimento tinha a intenção de tornar o agente com mais raiva do interno para assim poder aplicar com mais raiva uma agressão capaz de satisfazê-lo.
...O interno a contar o que havia feito, mutilou uma criança todinha, desmembrando-a para se vingar da mulher dele que tinha traído ele. O agente chegou ao ápice da raiva, do ódio e começou a torturar espancar, o interno, batendo no ouvido, batendo nos rins. O interno reagiu e para se livrar se  jogou na parede tendo aberto o supercílio e sangrando. O agente, ao ver o ato do interno, continuou a dar pontapés nos rins, chute na cabeça. Toda essa cena foi assistida por mais 03 agentes que pediram para o agente agressor parar com aquela sessão de espancamento....O agente, por este ato pediu demissão e não foi punido. O agente se encontra hoje arrependido e passou por tratamento psicológico, mas ainda continua com ódio de internos.

Portanto, a grande maioria dos indivíduos presos não tiveram melhores oportunidades ao longo de suas vidas, principalmente a chance de estudar, para garantir um futuro melhor. Nesse sentido, o tempo que despenderá atrás das grades pode e deve ser utilizado para lhe garantir estas oportunidades que nunca teve, por meio de estudo e, paralelamente, de trabalho profissionalizante. Além de ajeitar as celas, lavar corredores, limpar banheiros etc., os detentos precisam ter a chance de demonstrarem valores que, muitas vezes, encontram-se obscurecidos pelo estigma do crime.

CONCLUSÃO

Tentei desnudar fatos, dores e revoltas. Fiquei então prisioneira dessas existências humanas, de voz amordaçada; do interior da “muralha de ferro”. Esta  pesquisa mostrou-se também como uma minha travessia para o campo expressivo do “outro”. Ali, nós aprendemos a apiedar-nos e a apiedar-nos dos outros, desvelar a realidade do cárcere à partir da construção humanística, do vínculo que construímos ao tecer, ponto a ponto, passo a passo, na escuta do próximo – a teia de significados. Ali, como advogada, aprendi a lidar com saudades,  frustrações,  medos,  angústias, revoltas, a partilha da dor. Mesmo para uma pesquisadora, especialista em Direito, não é nada fácil!
A principal conclusão deste artigo é que o Sistema Prisional Brasileiro é falido e mal organizado que pune o criminoso muito além da pena, a ele imposta e que aquele sistema  ainda é mais criminoso que o próprio criminoso. Sistema que fere gravemente a própria legislação brasileira, pois a pena vai muito além do crime em si cometido;e que não ressocializa o criminoso .
Diferentemente do que ocorre, o preso aprende outras modalidades de crimes e ainda em local promíscuo e sem qualquer interferência do Estado. Para que o preso possa melhorar sua conduta, vai sendo instruído por criminosos e facções criminosas onde passa a fazer parte integrante de grupos que vão muito além dos crimes que ele cometeu.
Conclui-se que o sistema carcerário no Brasil, hoje, está falido;requer mudanças paradigmáticas e institucionais.. Mudanças paradigmáticas porque neste sistema as penitenciárias se transformaram em verdadeiras “usinas de revolta humana”, uma bomba-relógio que o judiciário brasileiro criou no passado a partir de uma legislação que hoje não pode mais ser vista como modelo primordial para a carceragem no país.
Assim, ocorre a necessidade de modernização da arquitetura penitenciária, a sua descentralização com a construção de novas cadeias pelos municípios, ampla assistência jurídica, melhoria de assistência médica, psicológica e social, ampliação dos projetos visando ao trabalho do preso e à ocupação de sua mente-espírito, separação entre presos primários e reincidentes, acompanhamento na sua reintegração à vida social, bem como oferecimento de garantias de seu retorno ao mercado de trabalho, entre outras, são algumas boas medidas para desarmar esta bomba.
A grande maioria dos indivíduos presos não tiveram melhores oportunidades ao longo de suas vidas, principalmente a chance de estudar, para garantir um futuro melhor. Nesse sentido, o tempo que despenderá atrás das grades pode e deve ser utilizado para lhe garantir estas oportunidades que nunca teve, por meio de estudo e, paralelamente, de trabalho profissionalizante. Além de ajeitar as celas, lavar corredores, limpar banheiros etc., os detentos precisam ter a chance de demonstrarem valores que, muitas vezes, encontram-se obscurecidos pelo estigma do crime.
A conclusão final a que se chegou, nesta tese, é a de que dignidade não é algo que se vê com freqüência dentro dos presídios brasileiros. Muitas prisões não têm mais a oferecer aos seus detentos do que condições subumanas, o que constitui a violação dos Direitos Humanos. A realidade nua e crua é que os presidiários, no Brasil, são maltratados, humilhados e desrespeitados em sua dignidade, contribuindo para que a esperança de seu reajuste desapareça, justamente por causa do ambiente hostil que se lhe apresenta quando cruzam os portões da penitenciária.
Enfim, á semelhança de Dante, no Inferno, fui até o fundo das verdades encobertas e ouvi a voz e a fala daqueles que a “Muralha de Ferro” amordaça. Sai de lá com o dever cumprido e a honra de denunciar, neste artigo, às Organizações de Direitos Humanos, minha voz que jamais será amordaçada.

1 Advogada, Consultora jurídica; sakyamune@hotmail.com.
2. PhD em Economia pela Cornell University;; Professor Titular aposentado da UFBA; jasmmenezes@gmail.com.

*Tese apresentada à Universidade Autônoma de Lisboa, no Doutorado em Direito, como requisito parcial para obtenção do Título de Doutorado em Direito.

Referências

CALHAU, Lélio Braga. Presídios como instituições totais: uma leitura em Erwing Goffman. Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 35, out. 1999. Disponível em: . Acesso em: 28 setembro  2013.
WACQUANT “A Aberração Carcerária à Moda Francesa, publicado em “Dados – Revista de Ciências Sociais”. Rio de Janeiro: Estrela Abreu, vol. 2, 2004, pp.215-232: (2007, p.455).
WACQUANT, L. (2007). Punir os Pobres: a nova gestão da miséria nos Estados Unidos. 3ª ed. Rio de Janeiro: Revan.
WACQUANt, L. (2001). As Prisões da Miséria. Rio de Janeiro: Zahar Editora.
OLIVEIRA, E. (2005). Vitimologia e Direito Penal: o crime precipitado ou programado pela vítima. Rio de Janeiro: Forense.
OLIVEIRA, E. A prisão contemporânea. A prisão dos primórdios. Perfil. Microsoft Power Point. Disponível em: www.esmape.com.br/dowloodsgeral/Globalização>. Acesso em 14.04.2007
Organização das Nações Unidas, ONU. (2001). Relatório Sobre Tortura no Brasil, Produzido pelo Relator Especial da Comissão de Direitos Humanos da ONU Sobre Tortura. Genebra, 11 abr. 2001 (anime). Disponível em: . Acesso em: 21 mai. 2001.
OLIVEIRA, E. (1997). Política criminal e alternativas à prisão. Rio de Janeiro. Forense
OLIVEIRA, E. (1993). “O Censo Penitenciário e a Crueza Existencial das Prisões no Brasil”. Ministério da Justiça/ Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, p.13.
Ministério da Justiça. (2000). Secretaria Nacional de Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Dados Consolidados - Total Brasil. Dezembro de 2000 (on line). Disponível em: http://depen.com. Acesso em: 07 fev. 2001.
MOSCOVICI, S. (2004). Representações sociais: investigações em psicologia. (2ª ed.). Petrópolis, RJ: Vozes.
Ministério da Justiça. (1994). Censo Penitenciário Nacional.
Ministério da Justiça. (s.d). Censo Penitenciário e a Crueza Existencial das Prisões no Brasil.
Ministério da Justiça. (s.d). Regras mínimas para o tratamento do preso no Brasil.
Ministério da Justiça. (s.d). Revista do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, v. 1, n. 1. 
LUDKE, M.; ANDRÉ, M. E. D. (1986). A pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU.
LAVILLE, C.; DIONNE, J. (1999). A construção do saber: manual de metodologia da pesquisa em ciências humanas. Porto Alegre: Artes Médicas; Editora UFMG.
JODELET, D. (1984). Representações sociais: fenômeno, conceito e teoria. Paris: Presses Universitaires de France.
Human Rights Watch, Hrw. (1998). Relatório: o Brasil Atrás das Grades (on line). Disponível em: <http://hrw.com>. Acesso em: 09 fev 2001.
GIDDENS, A. (2002). Modernidade e identidade. Trad. Plínio Dentzien. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora.
SANTOS, Boaventura; Marques, Maria Manuel L.; Pedroso, João; Ferreira, Pedro L. Os tribunais nas sociedades contemporâneas. Porto, Afrontamento, 1996.
FOUCAULT, M. (1972). História da loucura. São Paulo: Perspectiva.
FREIRE, P. (1992). Pedagogia da esperança: um reencontro com uma pedagogia do oprimido. (3ª ed.). Rio de janeiro: Paz e Terra.
FREIRE, P. (1983). Pedagogia do oprimido. (13ª ed.). Rio de Janeiro: Paz e Terra.
FREIRE, P. (2001). Pedagogia dos sonhos possíveis. São Paulo: Editora Unesp.
FARIA JÚNIOR, J. (1996). Manual de criminologia. Curitiba, (2ª ed.) Juruá.
FOUCAULT, M. (1977). Vigiar e Punir: o nascimento da prisão. Petrópolis: Vozes, p.277.
DROPA, R. F.  Direitos Humanos no Brasil: a exclusão dos detentos. “Brasil 500 anos de Exclusão .2003.
COMPARATO, F. K. (2004). A afirmação histórica dos direitos humanos. (3ª ed.). São Paulo. Saraiva.
BECCARIA, C. (2003). Dos delitos e das penas. São Paulo: Martins Claret, (Coleção A obra prima de cada autor)
AZEVEDO, R. (2007, 28 Março). Crime e castigo dentro de nós. Revista Época.
Azevedo, J. E. (1997). A Penitenciária do Estado - As relações de poder na prisão. Dissertação de Mestrado. Universidade Estadual de Campinas.
Apap, Georges et. al., (2002). Restituir ao cidadão a consciência de suas potencialidades. In. A construção dos saberes e da cidadania: da escola à cidade. Porto Alegre: Artmed.
SALIBA, Marcelo G. e Saliba, Mauricio G. O bagaço não reciclável. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n° 1083, jun 2006.
FOUCAULT; Michel. Trad. Vassalo; Ligia M. Ponde. Vigiar e Punir: nascimento da prisão. Rio de janeiro. Vozes, 1984.
FARIAS.José Eduardo O sistema brasileiro de justiça: experiência recente e futuros desafios. Estudos Avançados, 18 (51), 2004.
CHRISTIE.Nils Crime Control as Industry: Towards Gulags, Western Style, 3ª ed. Londres: Taylon and Francis, 2001. Robert Weiss. Comparing Prison Systems: Toward a Comparative and International Penology. Nova Iorque: Gordon and Breach, 1999.
RAND Michael. Criminal victimization in the United States, 1994. Washington: Bureau of Justice Statistics, 1997. FBI – Uniform Crime Report, 1995. Washington: Government Printing Office, 1997.
CHAUVENET,Antoinette Françoise Ortic e BENGUIGUI.George Le Monde dês surveillantes de prison. Paris: PUF, 1994.
OLIVEIRA, Edmundo. Política criminal e alternativas à prisão. Rio de Janeiro: Forense, 1997.
FARIA JUNIOR, João. Manual de criminologia. 2ª ed. Curitiba: Juruá, 1996.
[1] Ministério da Justiça, Departamento Penitenciário Nacional (www.mj.gov.br/snj/depen/sipen/).
[1] Folha de S.Paulo, 16/10/2001, p. C3, "Seria Necessário Construir um Presídio por Mês".
[1] Ministério da Justiça, Secretaria de Estado dos Direitos Humanos. Disponível em:   .
[1] Allen J. Beck e Jennifer C. Karberg, Prison and Jail Inmates at Midyear 2000. Washington: Bureau of Justice Statistics Bulletin, U.S. Department of Justice, March 2001 (www.ojp.usdoj.gov/bjs/).
[1] O Estado de S. Paulo, 24/11/2001, p. C10, "Juiz Quer Indulto Para Presos em Fase Terminal". Jornal do Advogado (OAB/SP), novembro 2001, p. 9, "Doenças Graves e Contagiosas nas Carceragens".
[1] O Globo, 4/1/2002, p. 8, "Governo Vai Apurar Rebelião em Rondônia". Na véspera, a imprensa chegou a noticiar a morte de 46 detentos.
[1] O Globo, 5/1/2002, p. 5, "Diretor de Presídio Já Tinha Sido Condenado